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É isso aí, Clara!
O Estado de São Paulo - 1998
 

Atriz comemora a mudança de sua personagem, que deixa de ser sonsa e ganha glamour em "Torre de Babel", ao entregar-se ao amor de Clementino (Tony Ramos)

Beatriz Coelho Silva

Finalmente, Maitê Proença recupera o glamour que sempre foi sua marca. A partir desta semana, Clara, de Torre de Babel, dá uma virada. Deixa de ser a mulher apagada e esquisita do primeiro mês da novela das 8. Segundo Maitê, a mudança é uma das poucas que estavam previstas na sinopse. "Foi uma forma de surpreender."

Maitê usa os cabelos mais curtos desde a semana passada, quando foram gravadas as cenas de Clara após sua primeira noite de amor com Clementino (Tony Ramos). Mas ainda não teve tempo de desfilar o novo visual pela praia de Copacabana, onde mora, no Rio. Seu dia começa às 7, quando sai para gravar no Projac (em Jacarepaguá, a 40 minutos de carro de sua casa). À tarde, volta correndo para encontrar Maria, a filha de 7 anos. Maitê se separou do pai de Maria, Paulo Marinho, há cinco anos. Hoje, se recusa a falar dos assuntos do coração. "Diga apenas que eu estou bem, que estou feliz."

Foi no trajeto entre Copacabana e Jacarepaguá, num dia de gravação da semana retrasada, que a atriz falou ao Estado. Entre uma resposta e outra, deu atenção às pessoas que, paradas no trânsito, comentavam sobre seu novo cabelo. Maitê falou dos planos, da opção pela espiritualidade e, principalmente, da novela.

Estado - Como foi fazer uma personagem sem glamour?

Maitê Proença - Clara é apagada, sem vida. Ela não quer relacionar-se com o mundo e por isso não valoriza seus atributos físicos. A mudança ocorre quando ela se apaixona por Clementino. Clara começa a enxergar o mundo com outras cores, com matizes mais vistosos. Isso acontece na vida real. Quando pinta uma paixão, a gente vê tudo com olhos benevolentes. Se você esbarra em mim, eu peço desculpas. Se eu não estiver amando alguém e a vida, a reação não vai ser a mesma.

Estado - Até que ponto uma mulher bonita como você se incomoda em aparecer feia?

Maitê - É estranho, não vou negar. Afinal, a gente sempre se arruma para melhorar e não para ficar mais feia. É chato ir ao espelho enfeiar-se. Mas o Sílvio de Abreu (autor), quando me falou da Clara, disse que ela seria uma personagem especial, que não se enquadraria em nenhum estereótipo, em nenhuma classificação já existente. Gostei disso, porque as pessoas vão ligar-se mais nela. Quando aparece uma personagem como Clara, que não cabe numa classificação, a gente primeiro estranha, depois presta atenção, aprende e fica menos preconceituosa. O público ficará mais atento à minha interpretação.

Estado - Como reagiria se encontrasse uma Clara na vida real?

Maitê - Daria uma chacoalhada nela e diria: "Minha filha, sai da toca, vá relacionar-se com o mundo!"

Estado - A virada estava prevista?

Maitê - É uma das mudanças já previstas na sinopse. A idéia foi mesmo mostrar uma pessoa que se nega à vida e muda com o amor. Aliás, fico feliz porque soube que o momento de maior audiência da novela até agora foi numa cena minha com Tony Ramos. Quem me disse foi Adriana Esteves, que veio dar parabéns.

Estado - O que achou de a trama mudar em função da reação do público?

Maitê - Fui das poucas pessoas que não entraram em pânico no começo. Sempre achei que a novela deveria seguir seu rumo normalmente. Sou contra mudar só porque a audiência caiu. Acho que houve precipitação. Nem deveria falar isso, mas falo porque tenho experiência suficiente para saber o óbvio: o novo assusta, mas o público se acostuma e acaba gostando. Foi assim com Guerra dos Sexos, também do Silvio de Abreu (1983). Na época, a direção da emissora achava que novela e comédia não combinavam e os ídolos da casa não podiam levar torta na cara. Pois Fernanda Montenegro e Paulo Autran levaram torta e a novela virou um marco. Com Salvador da Pátria (1989) foi a mesma coisa. Essa novela, do Lauro César Muniz, que está sendo reprisada agora, falava sobre o momento político do País. Diziam que o público não aceitaria um tema político, nem um par romântico feito por mim e pelo Lima Duarte. Foi outro sucesso.

Estado - Na época, você militou na primeira eleição para presidente após quase 30 anos. Vai repetir a dose?

Maitê - Estou sem tempo, sem informação e sem vontade. Nós, atores, só devemos lutar por uma causa que represente uma verdade absoluta para nós. Senão, é leviano. Falamos para um público grande, para pessoas que nos admiram. Não podemos falar sem refletir.

Estado - Quais são seus planos para 1998?

Maitê - Vou estar na novela pelo menos até o fim do ano, mas tenho um projeto de viver Santa Tereza D'Ávila no teatro. É uma peça escrita para mim, pelo Elói de Araújo, e é também resultado de uma busca espiritual à qual me dedico desde pouco antes do nascimento de minha filha Maria, há sete anos.

Estado - O que ocorreu nessa época?

Maitê - Aconteceram três coisas interessantes. Descobri como é o "ser atriz". Deu uma luz e tive vontade de mostrar o que havia compreendido após tantos anos de carreira. Ao mesmo tempo, começava a buscar o lado espiritual. Sou filha de ateus, meus pais nunca falavam de religião, por isso a busca se deu num leque aberto de caminhos. A terceira coisa é que havia uma criança dentro de mim. Isso, é claro, tomou logo o primeiríssimo lugar no meu pódio. E não combinava com muito trabalho. Só com a caminhada espiritual. Diminuí o ritmo. Só agora estou retomando o passo. Para depois da novela, escolhi viver uma personagem que tem a ver com este meu momento. As pessoas que saíram da banalidade por meio do contato com o divino sempre me fascinaram.

Estado - E sua filha?

Maitê - Ela é o que existe de mais fundamental na minha vida. O que mais gosto é de ser mãe da Maria. Mesmo quando tenho de gravar muitas horas por dia, dou um jeito de ter tempo para ela. A sorte é que Maria tem um pai muito presente, que também troca tudo pela companhia dela. Apesar de estarmos separados, continuamos próximos em função da Maria.

Estado - Você estava escrevendo uma autobiografia. Como está o projeto?

Maitê - Interrompi o livro por preguiça. Fiz uma releitura do material que produzi e achei que estava ruim. Faltava coragem para um mergulho mais fundo nessa história. Estou tomando distância para voltar com outro vigor.

Estado - Você posou nua duas vezes. Pretende repetir a experiência?

Maitê - Já está de bom tamanho, não acha?