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Um diamante de muitas facetas

Manchete - 1999
 

Por Regina Peixoto

No primeiro encontro para a entrevista, Maitê aparece sem maquiagem, calça corsário e camiseta brancas, óculos escuros, despida de glamour. Parece uma menina em seus 39 anos. Durante a seção de fotos, outra surpresa: dou de cara com aquele mulherão que estamos acostumados a admirar, ainda mais perfeita - como pode ser tão linda? Maitê é assim, como um diamante de muitas faces. "Acho natural que seja assim. Essas pessoas lineares, que têm uma única faceta, são meio monótonas, não é? Previsíveis, entediantes." Muitas mulheres parecem brotar da garota que foi para a Europa aos 18 anos, depois de ENTRAR para seis faculdades diferentes: "Não sabia bem o que queria e achava que o vestibular selecionaria um caminho para mim." Dois anos no exterior, um monte de experiências, cursos na Sorbonne, em Paris ("posso dar aulas de um monte de coisas"), e, na volta, a tentativa de seguir Comunicação na USP, abortada pelo excesso de greves que a desestimulou. Novos cursos no Masp, aulas de corpo... Maitê dava vazão à inesgotável curiosidade. Foi desse modo que surgiu a atriz, quase por acaso, após um teste que fez "por chinfra", depois de dar aulas de inglês e francês e fazer caleidoscópios para vender. Fez novela, teatro, cinema, teve seu trabalho exibido em festivais pelo mundo todo e acabou até ganhando prêmio em Nova York, com um filme que o Brasil nunca viu: Dezesseis zero sessenta, com Antonio Calloni e Marcélia Cartaxo. "O diretor resolveu brigar com todo o mundo, se indispôs com a CLASSE cinematográfica inteira aqui." Aberta para a vida, Maitê segue sem condicionamentos e conceitos prévios. Curte intensamente o mundo, enquanto vai fundo - com o mesmo empenho - na busca espiritual. "Diferente de religiosa", explica, "porque a religião é um conjunto de crenças, a espiritualidade um conjunto de experiências". Cheia de idas e vindas, anda por muitos setores. "Agora pratico meditação hindu e minha vida ganhou um aspecto ma is esotérico." A Ioga ela descobriu ao se internar em uma ilha, na Índia, para cuidar do corpo com a milenar medicina Ayurveda. Empolgada com a experiência, vai abrir uma clínica para aplicação deste tipo de medicina e para a prática da ioga. Dinâmica, já fez um filme este ano - Tolerância - e enquanto se entrega ao personagem da novela das sete na TV Globo, achou tempo ainda para uma participação especial em Bufo Spalanzani, com José Mayer, Tony Ramos, Otávio Augusto. Só não abre mão de uma coisa: nada de teatro, por enquanto. "Não sou só atriz, há outros setores da minha vida que quero ver atendidos. E o teatro está muito difícil, não se paga. Então para que, só para dizerem que sou uma atriz séria? Não preciso, só vou fazer com um projeto que valha a pena." Após a sessão de fotos para Manchete, em que ela discutiu com o fotógrafo cada clique, coloca-se à vontade, num quimono preto, para a entrevista.

Manchete: São 20 anos de carreira, 39 de vida. Que balanço você pode fazer disso?

Maitê: Não sou de olhar nem pra trás, nem pra frente. O presente é uma coisa efêmera e é preciso vivê-lo integralmente, interagindo com tudo à minha volta.

Manchete: Tem medo da velhice?

Maitê: Não me aflige. Vivo o momento, faço coisas que são boas para mim e que melhoram meu espírito. O corpo vai virar adubo. Mas se o envelhecimento me incomodar, dou um jeito. Existem tratamentos e cirurgias plásticas, posso pôr tudo de volta no lugar sem ficar aborrecendo os outros com dramas.

Manchete: Em seu site da Internet (www.maite.com.br) há histórias de viagens, onde você se arriscou muito com situações e pessoas desconhecidas. Você não sente medo?

Maitê: Ah, medo todo o mundo tem, né? Mas não deixo de fazer as coisas por causa disso. Sou atirada. Meu pai dizia que desde pequena eu subia na árvore mais alta, e se ele mandasse eu pulava. Eu me arrebentava toda, sou toda quebrada: coluna, perna, fêmur - botei um pino - sempre ossos importantes do corpo. Os dedos, quebrei vários. O pé, três vezes. Já fiquei de cadeira de rodas, mas essas coisas não me param.

Manchete: E se a Maria quisesse se atirar tanto assim?

Maitê: Não depende da minha vontade, é questão de temperamento. Mas ela é mais cautelosa que eu, graças a Deus! Eu me dei bem. Aqui é o contrário: quem segura a onda é ela.

Manchete: O que é mais importante na vida hoje, para você?

Maitê: Minha filha.

Manchete: A maternidade te mudou?

Maitê: Nem sei mais como é possível viver sem ser mãe, não me lembro qual era o sentido da minha vida antes.

Manchete: E os homens?

Maitê: Eu não falo desse assunto por respeito. As pessoas que entram na vida da gente nem sempre são pessoas públicas. E não têm de se tornarem, só porque você resolveu amá-las.

Manchete: Como você vivencia a sexualidade?

Maitê: É uma coisa natural... Conheci aquela liberdade conquistada nos anos anteriores à minha adolescência, o clima de "vamos usufruir dessa dádiva que temos". Aí, quando a gente começou a acreditar e tirou os preconceitos, os tabus, abriu a guarda, pumba! Vem a Aids. Então é claro que surgiram certas cautelas...



Manchete: Mas não atrapalha...


Maitê: Lógico que não. Quando algo ou alguém te despertar esse lado, vai. Vê se há afinidade, se vale a pena, investiga!

Manchete: Como é o homem ideal para você?

Maitê: Quando você se depara com a pessoa ideal, aquela que tem todas as características da tua listinha, e não acontece nada, então, meu bem, O IDEAL NÃO ERA IDEAL, né? FUJA, aquilo está fadado ao insucesso! E também A GENTE descobre SEMPRE que aquela imagem da listinha vai por água abaixo depois dos primeiros quatro meses, em que todo o mundo está seduzindo.

Manchete: Então não existe o homem perfeito...


Maitê: As pessoas se atraem é pelos defeitos: as falhas dos outros é que permitem à gente ser falho. São as inseguranças de alguém que me dão conforto para ser insegura E IMPERFEITA também. E na intimidade a gente quer isso. Então, não vá encontrando teu príncipe CERTÍSSIMO, porque ele deve ser in-su-por-tá-vel.

Manchete: Do que mais você gosta no seu dia-a-dia?


Maitê: Dos fins-de-semana no meu sítio. Tenho vaca, galinha, pato, coelhos... Fiz uma horta, plantei 500 árvores nobres e muitas árvores frutíferas, para atrair bichos. Tenho cachoeira, água de poço artesiano limpíssima... Uma maravilha, que fui construindo aos poucos, investindo na qualidade de vida da minha filha, Maria (nove anos), que leva suas amiguinhas lá, e na minha E DE MEUS AMIGOS.

Manchete: Você é uma supermãe?

Maitê: Não. Supervisiono, mas deixo fazer muitas coisas que outras pessoas proíbem por puro hábito. Ficar suja, cair na piscina de roupa... Qual o problema? Depois toma banho, seca a roupa... Tudo o que elas quiserem e não as deixa doentes, pode: pintar o corpo com tinta, ficar nua na cachoeira... A gente brinca de índio, canta, berra...

Manchete: Que cuidados você toma para manter a forma?



Maitê: Faço ioga, caminho três a quatro vezes por semana, ando a cavalo... De vez em quando, nado. Gosto de coisas ligadas ao ar livre. Adoro fazer rafting, canoagem... Já subi num vulcão ativo, oito horas de escalada, e ele começou a expelir lava quando a gente chegou perto.

Manchete: Você se considera vaidosa?

Maitê: Não fico fazendo unha, não passo tempo no cabeleireiro... Senão, fica tudo muito chato. Sou vaidosa em relação ao trabalho, à minha relação com as pessoas, à minha habilidade como mãe... essas coisas que formam o caráter da gente. Os atributos físicos não são mérito: papai e mamãe é que me deram, eu não fiz nada para tê-los. A gente tem de se orgulhar é das coisas que fez.

Manchete: Você já fez análise?

Maitê: Fiz até começar a tomar o Daime, que foi um divisor de águas. Talvez meu primeiro grande mergulho de autoconhecimento Aí a análise começou a me parecer conversa de botequim.

Manchete: E a espiritualidade, como chegou a ela?

Maitê: Nem sei. Meus pais eram profundamente ateus, não tinham nenhuma brecha, mas deixaram o leque aberto para mim. E eu experimento tudo, profundamente. Por exemplo, estou mais voltada hoje para a meditação, mas quando vejo Roberto Carlos cantar Nossa Senhora no meio multidão, eu choro. Sou devota da Virgem Maria, já caí ao chão diante dela em Medjugorje (CROÁCIA), chorando durante uma hora. As pessoas em volta se ajoelharam e rezaram. FOI CATÁRTICO, SUBLIME.

Manchete: Você esteve num workshop com o especialista em vidas passadas Brien Weiss, no Rio de Janeiro, este ano. Como foi?

Maitê: Ele pediu que trocássemos um objeto pessoal com uma pessoa desconhecida, por alguns minutos. Segurando o relógio da moça que estava ao meu lado, consegui visualizar várias cenas de sua vida, como ela confirmou. E ela dizia não sentir as próprias pernas, quando esteve com meu anel entre as mãos.

Manchete: Qual o significado disso?
Maitê: Tive um acidente sério, há dezoito anos, e estive sob a ameaça de ter a perna amputada. Fiquei meses sob tração, depois na cadeira de rodas, levei um ano me tratando. E durante algum tempo perdi a sensibilidade nas pernas. Foi isso que ela captou.

Manchete: O que te é indispensável hoje?

Maitê: O bom-humor, o alto astral, E MUITA BOA-VONTADE NO CAMINHO.

Manchete: Sua maior alegria?

Maitê: Maria é minha maior alegria.

Manchete: E seu maior orgulho?

Maitê: Dar conta da minha vida, de tudo o que faço, de educar minha filha... DE SER PROFUNDAMENTE HONESTA.

OLHOS, LEGENDAS E AFINS
"Cada ambiente de minha casa tem uma cara, reflete uma fase minha. Chamei um arquiteto para mudar meu quarto, que já não condiz comigo, e ele me flagrou: olhava EM VOLTA tentando perceber uma personalidade, e via umas doze. "Vejo as pessoas que hoje estão na idade do vestibular tão desmotivadas! Sem curiosidade nem tesão, completamente blasé em relação às coisas que as cercam. Não sei se é o mercado de trabalho, a falta de perspectiva que contribui para isso, mas o mundo fica muito reduzido. O meu, na idade delas, era amplo. E ainda é, graças a Deus!"

"Quando você se desvencilha da caretice, aquela coisa de eu não posso porque vai sujar meu sapato, acaba com um monte de regras que não servem pra nada."