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As mulheres estão muito masculinas

Revista Contigo - 10/2006
 


A atriz, escritora e agora dramaturga, fala que as mulheres não sabem o que querem e que deveriam dar mais tempo para cuidar de si mesmas.

Por André Nigri

Maitê Proença Gallo está sempre se reinventando. Aos 47 anos, depois de ter feito 18 novelas, participado de 15 filmes, há dois anos essa paulistana radicada no Rio publicou um livro de crônicas, Entre os Ossos e a Escrita (Ediouro Editora), e este ano escreveu uma peça, Achadas e Perdidas (em cartaz em São Paulo), onde interpreta dezoito personagens. A produção, uma adaptação do volume de crônicas, é assinada por ela também. Maitê integra ainda o "elenco" do Saia Justa (GNT). Mas engana-se quem pensa que tal acúmulo de trabalho traduz-se em pura alegria. "Não existe felicidade com excesso de atividade", disse ela, refém da ponte-aérea Rio-São Paulo. Maitê precisa regularmente de pausas. "Se eu pudesse, iria para uma ilha deserta e ficaria escrevendo."
Namorando o assessor da Confederação Brasileira de Futebol, Rodrigo Paiva 42, há dois anos, Maitê está mais serena. Mãe de Maitê Proença Marinho, 15, com o empresário Paulo Marinho, 53, ela se auto-define: "Estou me sentindo muito viva. É um momento de muita fertilidade. E eu resolvi me reinventar em um momento em que as pessoas da minha idade se acomodam."
No fim do ano, Maitê vai se dar férias e viajará para o Laos, um dos países menos explorados e exóticos do sudeste asiático. "Soube que lá vive o povo mais puro do mundo", disse. Quando voltar, ela pode se reinventar de novo: "Eu posso decidir criar galinhas."

Mulher

"O que as mulheres querem elas não sabem. As mulheres estão muito masculinas. Já ganharam muito espaço. Agora é saber o que fazer com esse espaço. Talvez abrir mão de algumas coisas porque você não consegue lidar com tanta atividade ao mesmo tempo. Nós abrimos muitas frentes. Está na hora de derrubar uma delas, por exemplo, para que se possa ser uma boa mãe de fato, e não uma boa mãe de revista. Porque as mulheres precisam, quando mães, sentir-se uma boa mãe. É um condicionamento muito forte da sociedade. Então, elas sabem intimamente que elas são umas mães de merda. Porque no trabalho ela precisa ser maravilhosa, porque ali é onde as pessoas a estão vendo. E ela sabe para que aquilo funcione, ela deixa de fazer em outro lugar. E ela se sente muito mal com isso, só que esconde. A maternidade não aparece. O que aparece é na empresa onde ela é uma grande pessoa, exuberante, inteligente, uma mulher incrível. Ali é aplaudida. Aí quando o filho tiver 23 anos, cheio de traumas, essa mãe se pergunta: mas onde foi que eu errei? E ela sabe intimamente onde errou, por isso fica infeliz. Acho que antigamente as mulheres faziam concessões e havia mais nobreza. Não existe mais isso. As pessoas só fazem tudo para se exibir.
Quando se opta por esse caminho, você olha em volta e vê que está sozinha. Cadê o amor, será que ele aguentou te esperar? Quando chega em casa e se dá conta de sua solidão, ou você precisa de mais trabalho, ou ficar na internet, no telefone, ou saindo, botando uma saia mais curta do que seria adequado para sua idade e fazendo coisas para parecer que tem 23 anos. Será que não é hora de ficar em silêncio, lendo um livro, ou conversando com as pessoas desinteressadamente?"

Celebridade

"Acho que toda pessoa pública precisa de uma porta dos fundos. Se você não tiver, você terá, mesmo que seja escondido do público: nas drogas, ou sendo perversa dentro de casa. Mas você pode encontrar essa saída dando tempos. Por exemplo, eu não gosto de dar entrevistas quando não tenho um trabalho. Se eu for ao dermatologista, eu prefiro que não seja noticiado."

Morte

"Pessoas não são substituíveis. Quando elas se vão, deixam um buraco. E ele fica ali, tem que se conviver com isso. Eu carrego meus mortos no amor que sinto e que não morreu com eles. Não é pesado. É como é." (quando Maitê tinha 12 anos, seu pai, o procurador Carlos Eduardo Gallo, matou a sua mãe, a professora de filosofia Margot Proença. Depois, Carlos se mataria com um tiro no peito)

Sexo

"Pra mim é muito melhor aos 40. Mas isso é pessoal, não acredito que seja a regra."

Tristeza

"Já chorei por injustiças, pela decepção com amigos, pela incompreensão do mundo. Atualmente choro de cansaço. Há um excesso de compromissos chatos. A falta de pausas, a armadilha corrida em que a gente vai se colocando, isso me faz chorar. Ver a vida correr sem poder curtí-la é uma baita falta de sabedoria. Chegar onde estou e perceber que fiz isso comigo é desesperador. Preciso de uma rede, de sombra, e baldes de água fresca pra me curar."

Relacionamento

"O Rodrigo (Paiva) e eu nos gostamos muito, caso contrário não estaríamos juntos porque somos muito diferentes e isso dá trabalho. A maturidade faz com que a gente tenha paciência pra remar a favor do afeto que vai resistindo às diferenças."

Felicidade

"Não existe felicidade com excesso de atividade. Neste momento, por exemplo, eu me coloquei numa armadilha. Estou fazendo muito mais coisa que eu gostaria de fazer. Eu gasto muito tempo em trânsito, de um lugar para outro. É um momento muito complicado. Eu estaria muito mais feliz se estivesse fazendo uma coisa só. Se eu pudesse ir para uma ilha e ficar escrevendo. Quando você está madura, e encontra uma forma de expressão, você quer explorar, mas eu não posso. Eu preciso do silêncio e da introspecção. Na correria, você anda na boiada. Você nem pensa se quer ou não fazer aquilo. Quando meu tempo está mais espaçado, naturalmente eu seleciono melhor as coisas. Quando as pessoas acham que você está feliz, é uma felicidade muito aparente. Agora por exemplo pode estar parecendo que eu estou muito feliz porque as coisas estão dando certo: escrevi uma peça e ela vai bem. Escrevi um livro que foi lançado em Portugal e ficou em quarto lugar entre os mais vendidos. É um momento de êxitos, eu deveria estar satisfeita, mas por dentro não há serenidade, e é necessário haver serenidade."

Trabalho

"Eu trabalho tanto para poder ter liberdade e fazer o que eu quero. Para ter liberdade você acumula sua vida de atividades e aí você consegue. Você passou o dia inteiro para gozar algo que acontece em menos de duas horas. É muito melhor talvez deixar as coisas correrem solta."


Pausa

"Há duas Maitês, uma que quer se deitar na rede e outra que quer fazer. Eu fico muito nervosa. Tento administrar as coisas por um período, aí chega uma hora em que dou um tempo. E viajo. Vou para o Laos, porque não adianta ir à esquina porque tudo é muito reconhecível. Essa ruptura faz com que eu acorde. Aí eu volto. Eu ouvi dizer que no Laos é onde vive o povo mais puro do mundo. Aí depois de um mês de Laos, posso voltar e decidir por exemplo criar galinhas. É uma espécie de meditação. E preciso dessas pausas até para descansar da Maitê. É muito confortável as pessoas não terem nenhum informação prévia a seu respeito. A pessoa pública não tem isso."

Maturidade

"O país está muito bobo, medíocre. As pessoa valorizam tudo que não interessa. Querem uma casa ao invés de uma lar, uma posição ao invés de respeito, milagres artificias ao invés da saúde. Intimamente as pessoas sentem que estão vazias. Aí como não têm nada dentro, elas se preocupam excessivamente com o de fora numa luta inglória pra manter o que está fadado a perder o glamour. Nada é mais sedutor do que a verdade. Uma velhinha autentica, única, tem muito mais graça que uma mulher de 40 que acha que tem 18."