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Sedução
Revista Época - 2004
 

O bebê chora, a mãe vai correndo colocar um peito de leite quente na sua boca, e deu-se o início do jogo de sedução. Ele então chora porque está claro, porque está escuro, porque está molhado, porque quer brincar, e por aí vai. E o carinho vem, no embalo do amor materno. Eu também, se pudesse, faria até hoje, você não? Pois a gente faz, seduz do dia que nasce até o dia do fim. Pra não dar na vista, vai aprendendo a sofisticar a coisa. É que a coisa não serve só pra chamar a mamãe ou, mais tarde, pra namorar. A gente usa pra atrair amigos, por uma risada, uma conversa fiada, para fazer negócios… é da natureza dos bichos gregários que somos. Li por aí que as táticas de atração não mudaram desde nossos ancestrais, gostamos das mesmas coisas que atraíam nossas tataravós e fazemos as mesmas gracinhas que provocavam tesão no vovozinho da vizinha. Apenas, hoje, os recursos para continuar bonito e gostoso multiplicam-se pela hora, e a gente corre atrás, desvairada, pra não perder seja lá o que for.

Essas moças chinesas, por exemplo, que encompridam a perna por meio de cirurgias dolorosíssimas. Parece que os ossos, depois de sucessivas fraturas e recalcificações, sofrem um processo de osteoporose que deixa a perna frágil a ponto de quebrar andando na rua. Aí, como disse minha filha, “pra que ficar mais alta se vai passar a vida sentada?”.

A Demi Moore é outra. Tudo bem que a mulher está um colosso. E tudo bem também que ela tenha gastado os tubos com isso, já que os tubos eram dela e ela os tem sobrando. Mas foram horas de cirurgias complicadíssimas! Se for contar corrido, a criatura deve ter passado um ano anestesiada, e isso não pode fazer bem pra ninguém. Nem para as deusas.

E a Carolyn Bessette, aquela elegantíssima, mulher do John John Kennedy? Soube que antes de morrer a lindona passou a tarde num salão de beleza trocando a cor da unha. A pedicure não acertava o tom de lavanda de que madame fazia questão. Alguém ligava para seu celular avisando que o avião que a levaria a uma festa de casamento estava esperando, e que ela se apressasse, para voar em melhores condições. Mas Carolyn preferiu fazer a passagem de unhas irretocáveis. Afinal, considerando-se a ocasião, tão importante…

Quando fui a primeira vez ao Marrocos, devia ter uns 18 anos. Estava passeando pelo mercado em Marrakesh e ouvi de um menino: “Uma mosca por uma noite de amor.” Ele vendia umas coisas pretonas meio azuladas, e eu pensei: “Ora ora, afrodisíaco só funciona em filme de época.” Mas o moleque garantiu que o negócio era poderoso. Meio de chinfra, levei oito. Me enfiei num botequim, pedi um cous-cous pra não ter que engolir aqueles nojos a seco, misturei tudo e mandei. Na época eu não era muito afeita às coisas do sexo. Achava chato. Aliás, só fui me entender com o bom da história lá pelos 25. Mas eu tinha um namorado que era muito afeito. Ele estava me esperando no hotel e eu queria impressioná-lo. Por uma vez na vida seria aquela fêmea toda instinto, meio capa da Nova, uivando de um prazer selvagem que eu nunca chegava nem perto de sentir. Nós estávamos viajando sem grana, hotel fuleiro, e o banheiro era do tipo que tinha um buraco no chão fazendo as vezes de vaso sanitário. Pra encurtar, lá pelas tantas o negócio bateu, e bateu firme. Minha sensibilidade ali ficou de tal ordem que por umas doze horas não dava pra encostar nem brisa de ar. A única coisa que proporcionava alívio ali era fazer pipi por ali. Mas pipi, como se sabe, acaba. Eu então passei a noite de cócoras, esperando e esperando por um próximo momento de efêmero relaxamento. De cócoras, gemendo, mas não de prazer, eu implorava ao namorado que fizesse alguma coisa por mim. E ele, perplexo, respondia: “A única coisa que posso fazer, Maitê, você já disse que nem pensar.”

Bem que o menino tinha avisado: UMA mosca. Mas no afã de seduzir…