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Papo de copo
Revista Época - 2005
 

Moça: — Tô bebendo pra caramba, não consigo parar, acho que sou alcoólatra.

Homem: — Qual a sua bebida?

Moça: — Cerveja.

Homem: — Ah, mas com cerveja o caboclo nem desce.

Rapaz: — Desce sim, e vem acompanhado de uma pomba-gira gay. Outro dia levei pra casa um moço, me fartei com ele e na manhã seguinte, não satisfeito, ainda acompanhei a criatura ao trabalho. Quando vi, tava de cuecas numa cerimônia do Corpo de Bombeiros fazendo discurso pela liberdade de expressão. Parei de beber ali.

Moça: — E essa cerveja na sua mão?

Rapaz: — Pois é, voltei. Tava ficando caladinho, triiiste…

Homem: — O problema não é a bebida. É uma questão de li berdade interior, se tu tem, esse povo careta não te compreende.

Moça: — Isso é mesmo. Na maior parte do tempo você tá ali inofensivo, rindo à vontade e vem aquele sujeito implicante, com inveja do voo, pra julgar sua alegria.

Homem: — E a gente bebe pra voar. Se eu tenho que parar na terceira dose, volto pra casa de asa quebrada.

Rapaz: — É o encurtamento dos espíritos, messsquinharia das almas…

Homem: — Já rebarou como o bovo anda maledicente? Cadê a alegria de ser brasileiro? Onde foi parar a graça, as virtudes que a gente via nos outros?

Moça: — É a imbotência, meu caro. Não tenho como sair da minha situação miserável, então eu relativizo, pioro os outros pra eu crescer.

Rapaz: — Estamos na gestão da escassez, que merda, hein?

Moça: — Zó bebendo…

Rapaz: — Garrçom! Outra rodada.

Homem: — Mas eu não tenho problema com a bebida. Como dize o Keith Richards, meu problema é com a bolícia. Outro dia fui fazer um bipizinho engostado na árvore, como a gente vê tanto por aí, e a polícia veio tirar satisfações.

Rapaz: — Tava de carro?

Homem: — De táxi. Pedi pro votorista zar uma parada, eram três da manhã, eu metido num pinguim, o gara compreendeu. Tô ali eu e Deus, e me vêm os guardas, garamba!

Rapaz: — E aí?

Homem: — Aí nada. Molhei a mão deles e entrei de volta no táxi.

Rapaz: — Gambada de usurbadores! É na política, na bolícia… Buxa, gente, às vezes bate uma solidão, me sinto tão ingombreendido nesse mundo hostil.

Moça: — Eu também. E a gente vai buscar gompanhia no amor, mas a solidão só faz aumentar. Comecei a sair gum vulano que não era artista. O sujeito chamava figurino de uniforme, refletor je holofote, ensaio de trreino e estreia de inauguração. Er-ra desalentador…

Homem: — Desalendador… Zó bebendo. Garçom!

Rapaz: — Você falou no Keith Richards. Sabe que ano passado ele teve hospedado na gasa de um amigo beu. Diz que de manhã o gara faz tudo certinho, toma vitamina com frutas, leite, grra-noo-la, mas pra equilibrar mete uma zose de vodka.

Homem: — E o Mick Jagger? Perguntaram como ele vazia — com a vida que levou — pra ensinar os filhos a begar leve goas zroogas. Sabe o que o caara rezpondeu?

Moça: — Eu zei, escuta, eu zei. Ele jisse assim, Kids, just look at Uncle Keith. Hahaaha!

Rapaz: — Peraíea! Vocês zabiam que os Ro-olling Stones vão vazer ouutro jow no Braasil?

Moça: — Merrece um brinde! Viva o rooock eem roll!

Todos: — Vieva!